Cruzeiros marítimos injetaram R$ 2 bilhões na economia brasileira


Os cruzeiros oferecem uma série de vantagens para os cruzeiristas, como a comodidade de em um único pacote de serviços ter acesso a hospedagem, transporte, alimentação e lazer (peças de teatro, dança, arte, festas e ginástica). Além de tudo isso, com um custo acessível, o cliente pode visitar várias cidades em uma mesma viagem, aproveitando o tempo em que o navio fica atracado no porto. Por motivos como esses, os cruzeiros marítimos seguem em expansão pelo mundo. E no Brasil ainda há desafios a vencer para que o setor desenvolva todo o seu potencial.

O III Fórum CLIA Brasil 2019, realizado em Brasília, no último dia 28, teve o objetivo de tratar de entraves relacionados a carga tributária, custos, regulação e infraestrutura portuária, para chegar a um objetivo comum de alavancar o setor no País, gerar mais empregos e contribuir para a economia nacional.

Segundo a Associação Internacional de Cruzeiros (CLIA), em 2018, o número total de cruzeiristas no mundo chegou a 28,5 milhões. Em 10 anos, a procura por viagens a bordo de um navio aumentou pouco mais de 60%, passando de 17,8 milhões em 2009 para os quase 30 milhões previstos para 2019.

Em 2019, o setor ganhará 24 novos navios e capacidade adicional de 42.466 leitos e, em 2020, mais 25 embarcações, podendo receber mais 43.080 cruzeiristas, segundo a Cruise Industry News. Em oito anos, serão mais de 130 novos navios lançados pelo mundo, um aumento de mais de 50% da oferta de leitos de hoje.

No Brasil, a temporada 2018/2019 de cruzeiros marítimos (que teve início em 13 de novembro de 2018 e encerrou-se em 18 de abril de 2019), com 7 navios, foi responsável por um impacto econômico de R$ 2,083 bilhões na economia, 16,2% a mais na comparação com o período 2017/2018. Foram 841 dias de navegação, em 14 destinos nacionais e 462 mil cruzeiristas (crescimento de 10,5%).

Esses dados foram apresentados no Estudo de Perfil e Impactos Econômicos de Cruzeiros Marítimos no Brasil – Temporada 2018/2019, durante o III Fórum CLIA Brasil 2019. O estudo foi elaborado em conjunto com a Fundação Getulio Vargas (FGV).

Todo esse impacto ocorreu na economia do País, mesmo com a quantidade de navios muito abaixo do que já houve um dia. O Brasil teve o recorde de 20 navios, com 800 mil cruzeiristas, na temporada 2010/2011. A partir da temporada 2012/2013 houve contínua redução do fluxo de cruzeiros na costa brasileira, com diminuição do número de navios. Porém, desde a temporada 2017/2018, o setor vem demonstra ndo reação, apesar da estabilidade na quantidade de navios, com aumento do número total de cruzeiristas e maior impacto econômico.

O desafio agora é recuperar a quantidade de navios no Brasil e fazer o setor deslanchar de vez. O presidente da CLIA Brasil, Marco Ferraz, destacou que esse é o segundo período de alta, e a tendência é continuar crescendo nos próximos anos. “A grande questão é que, ao lado dos dados positivos, existe a constatação de que os números poderiam ser bem melhores, com avanços e ajustes na regulação, infraestrutura e desenvolvimento de novos destinos. O objetivo da CLIA é melhorar o ambiente de negócios para atrair mais navios de cruzeiros, abrir portas para os destinos, fortalecer o turismo e ter uma parceria de sucesso com o País e com as comunidades, já que nosso setor é forte gerador de empregos e de renda”, enfatizou. Ferraz acrescentou que, se for aplicada a média de crescimento global anual, os 800 mil cruzeiristas de 2010/2011 hoje seriam mais de 1,2 milhão navegando na costa brasileira.

A presidente da CLIA Global, Kelly Craighead, afirmou que o Brasil tem “uma oportunidade incrível” de se tornar uma referência como destino de navios de cruzeiro. Entretanto, ela destacou que alguns obstáculos precisam ser vencidos para melhorar o ambiente de negócios. “É realmente preciso cuidar de como os negócios são feitos em relação a regulações e taxas, que são duas coisas óbvias – mas também há necessidade de investimento em infraestrutura. Com o trabalho em parceria com o governo, podemos superar os obstáculos para que o Brasil se firme como destino mundial de cruzeiros”, disse Kelly Craighead.

Geração de emprego

Na temporada 2018/2019 foram gerados 31.992 postos de trabalho no Brasil, 15,3% a mais que no período anterior. Desse total, 2.115 foram de tripulantes e outros 29.877 empregos diversos, de forma direta, indireta e induzida, motivados pelos gastos dos turistas nas cidades portuárias e visitadas, além dos gerados na cadeia produtiva de apoio ao setor.

O estudo da FGV destaca que as oportunidades de negócios geradas pelos cruzeiros marítimos não se restringem às cidades portuárias, mas impactam também municípios que ficam longe do mar. Isso acontece porque há contratação de serviços e compra de insumos em diferentes regiões do Brasil, além das vendas de cruzeiros por agentes de viagens espalhados pelo País.

Sustentabilidade em destaque

Para Kelly Craighead, o setor de cruzeiros é líder em inovação e em proteção ao meio ambiente. Ela afirmou que há investimentos em reciclagem, economia de energia, redução de emissões, reúso de água e tratamento de resíduos e do lixo, como exemplos de preservação e sustentabilidade. Tudo isso para incrementar a experiência dos cruzeiristas. “Os cruzeiros nos últimos dez anos apresentaram crescimento, e neste ano a expectativa é

transportar 30 milhões de passageiros. O setor pode oferecer aos passageiros experiências e oportunidades diferenciadas. Inovação e tecnologia fazem parte dessa experiência. E hoje o setor está muito preocupado com a responsabilidade que vem junto com todo esse crescimento”, destacou.

O cuidado com a proteção do meio ambiente esteve presente na abertura do evento e também no último painel do Fórum. O presidente da CLIA Brasil, Marco Ferraz, mediou o painel e ressaltou que esse assunto é tratado com seriedade. “Levamos muito a sério esse tema e, a cada ano, ficamos mais conscientes e mais sustentáveis”, disse.

Os palestrantes relataram as medidas de sustentabilidade, como a forma de retirada e a destinação de resíduos dos navios e o uso de combustíveis limpos. Foi o que destacou Jennyfer Tsai, diretora de Infraestrutura da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), empresa que administra o maior complexo portuário da América Latina. “Os cruzeiros estão mesmo comprometidos com o meio ambiente e, em relação aos resíduos, vemos uma destinação correta que é inclusive usada como parâmetro para implementar em outros segmentos”, disse.

A especialista da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Viviane Barreiros ressaltou que “há correlação entre saúde e meio ambiente, que interfere dentro e fora do navio”. O secretário de Ecoturismo do Ministério do Meio Ambiente, André Pitaguari Germanos, destacou o papel das empresas e associações do setor nas questões relacionadas à sustentabilidade ambiental e se colocou à disposição para o diálogo e para ações coordenadas.

Bud Darr, relações governamentais da MSC, afirmou que os cruzeiros são líderes na redução de carbono e na eficiência energética, nos investimentos em gestão de seus resíduos, na reciclagem e na inovação. “Vale lembrar também que os cruzeiros são pioneiros em redução de desperdício”, afirmou.

Medidas podem reduzir tributação sobre o setor

O setor de cruzeiros marítimos tembuscado construir soluções conjuntas com o Governo Federal e parlamentares para tornar a tributação mais justa e, assim, melhorar o ambiente de negócios.

O presidente da CLIA Brasil, Marco Ferraz, disse que, após sugestão do setor, o governo estuda a edição de uma medida provisória para pôr fim à incidência de PIS/Cofins sobre o afretamento de embarcações e sobre venda e importação de óleo combustível marítimo (bunker). Essa tributação é atualmente exclusiva do setor de cruzeiros, não impactando o segmento de cargas, por exemplo.

De acordo com Ferraz, a CLIA e outras entidades estiveram, recentemente, em reunião com o presidente Jair Bolsonaro, a convite do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, para tratar da tributação sobre o setor. Ele contou que o presidente da República se mostrou receptivo à proposta de isonomia feita pelo setor e encaminhou os estudos para o Ministério da Economia.

“Essa tributação gera um impacto muito grande para o setor, mas para o governo, não. Para a indústria de cruzeiro isso afeta o preço final e torna o Brasil pouco competitivo”, afirmou Ferraz.

Também está em análise pelo governo a prorrogação da medida provisória que reduz de 25% para 6% a alíquota sobre remessas enviadas ao exterior para pagamentos de serviços turísticos. A medida perde a validade ao final deste ano e vai afetar todo o trade do turismo se não for estendida.

Incentivo ao turismo

O ministro do Turismo disse que o gover no reconhece a relevância dos segmentos turísticos para a economia do País e, por isso, já adotou medidas de estímulo. Entre elas, está a isenção de vistos para turistas dos Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália, demanda de mais de 15 anos do setor de turismo. Marcelo Álvaro também citou a aprovação de medida provisória que permite até 100% de capital estrangeiro em companhias aéreas brasileiras. “Foi uma ação importantíssima, mostrando que o Brasil agora abre o mercado para o mundo”, disse.

No Fórum, o ministro anunciou que, em cerca de 30 dias, será lançada linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no total de R$ 5 bilhões para a construção de 15 portos.

O ministro lembrou que, apesar de o Brasil ter quase 210 milhões de habitantes, o País responde por apenas 0,25% do número de cruzeiristas no mundo. “Quando cheguei no Ministério, me perguntava como uma costa tão bela, tão maravilhosa, podia ter apenas sete navios operando. E o Marco [Ferraz, presidente da CLIA Brasil], melhor do que ninguém, nos explicou que os cruzeiros marítimos ainda engatinham em nosso País, principalmente pela falta de infraestrutura portuária”, disse.

Mudanças na legislação

O presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Turismo (Frentur), o deputado federal Herculano Passos, destacou que são necessárias mudanças na legislação para incentivar os cruzeiros. Ele acrescentou que, com a retomada do crescimento econômico e as reformas da Previdência e Tributária, haverá mais investimentos no País. “O sonho do brasileiro é conhecer o Brasil – isso foi constatado em uma pesquisa feita pelo Sebrae. E a gente, como representante do povo, quer que esse sonho seja realizado. E para isso, tem que diminuir o custo do turismo. Para o setor naval, é importante ter menos burocracia na atracagem nos portos, diminuir o custo do querosene, diminuir os impostos”, disse, destacando que relatou projeto de lei que reduz PIS/Cofins sobre serviços de cruzeiros. O texto seguiu para tramitação no Senado.

Regulação do setor

Durante o Fórum, especialistas também debateram sobre a regulamentação da praticagem, serviço técnico de assessoria aos comandantes de navios. O prático é o profissional habilitado pela Marinha do Brasil para garantir condições de segurança, levando em consideração ondas, maré, vento, correnteza, profundidade, tráfego e se há bancos de areia, por exemplo. Os valores do serviço são livremente negociados entre os práticos e as empresas. Entretanto, com os preços acima da média mundial, como foi dito durante o debate, é preciso discutir uma regulação econômica para que se tenham custos mais competitivos. Algumas das sugestões apontadas pelos especialistas foram a criação de uma contabilidade regulatória e que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) passe a ser reguladora do setor.

Insegurança jurídica prejudica setor de cruzeiros

Um dos maiores entra ves do se tor decruzeiros são as questões trabalhistas. Especialistas ouvidos durante o III Fórum CLIA Brasil 2019 consideram que o poder Judiciário no Brasil falha na interpretação da legislação relacionada ao trabalho marítimo internacional, por desconhecimento sobre o dia a dia do tripulante e por se basear em princípios abstratos, sem amparo na legislação. Com isso, há estímulo às ações trabalhistas. Há atualmente passivo trabalhista de cerca de R$ 200 milhões relacionado a 1,5 mil ações.

O problema está na aplicação pelos juízes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vez da Convenção Internacional do Trabalho Marítimo, criada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2006, e que é respeitada pelos navios em todos os destinos operados no Mundo. Essa situação, avaliaram os especialistas, fere o princípio da segurança jurídica, primordial para as empresas investirem no Brasil.

Em outros países a Convenção já foi ratificada, mas no Brasil ainda está em tramitação no Congresso Nacional. Apesar disso, há três anos, o setor assinou um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público do Trabalho para cumprir as regras da Convenção.

Participaram deste painel o coordenador regional do Trabalho Marítimo e Aquaviário do Ministério Público do Rio de Janeiro, Maurício Coentro, e os advogados especialistas Rodrigo Mattos, Patrícia Lima e Valton Pessoa. A mediação do debate ficou com o professor e advogado Nelson Mannrich.

Próxima temporada terá novos atrativos

A temporada 2019/2020 terá 8 navios e mais opções de destinos para os cruzeiristas idades já estão preparadas, e empresas decruzeiro têm roteiros definidos para a temporada 2019/2020. No total, serão oito navios, com 530.121 leitos divididos por 144 roteiros.

Além do já tradicional Porto de Santos, com previsão de quase 100 embarques, a próxima temporada traz novidades. Uma delas é a cidade de Itajaí, em Santa Catarina, que passará a ter embarques e desembarques. Também em Santa Catarina, as conversas avançam no sentido de buscar novos destinos, como São Francisco do Sul, Florianópolis, Imbituba e Penha, que já tem sucesso com o Parque Beto Carrerro World. O prefeito de Penha, Aquiles da Costa, quer aproveitar mais o potencial da região, com inauguração de um píer exclusivo para receber os navios de cruzeiros. “Providenciaremos um píer para que as pessoas possam conhecer a beleza da nossa cidade”, disse. Ainda no estado, Balneário Camboriú está incluída na rota de transatlânticos pela terceira vez e contará com 28 escalas.

No Nordeste, Salvador se transformou em um importante ponto de embarque, com mais de 50 escalas e 200 mil cruzeiristas. O secretário de Turismo da Bahia, Fausto Franco, disse que é importante somar forças entre o setor público e o privado para que mais navios venham para o Brasil. “O estado entendeu que os navios estão no centro do desenvolvimento do turismo da região e do País. O papel do estado é viabilizar, e do privado, fazer”, afirmou.

O prefeito de Búzios, Henrique Gomes, disse que o compromisso é manter o píer da região “à altura de receber os transatlânticos”. “Hoje é um atrativo para a economia de nosso município. E estamos estudando a viabilidade para mais um ponto de fundeio para ter mais navios”, afirmou.

A secretária de Turismo de Ilhabela, Bianca Colepicolo, disse que a cidade quer estar sempre pronta para receber os navios, com segurança. “Temos que trabalhar muito pensando em integração com a população do lugar e em conjunto com órgãos do estado”, disse.

Durante o Fórum, destacou-se que os terminais de passageiros estão cada vez melhores para receber os cruzeiristas. Os terminais de Santos (Concais – SP), Rio de Janeiro (Pier Mauá – RJ), Salvador (Contermas – BA), Recife (Porto de Recife – PE) e Itajaí (Píer Turístico – SC) acompanham a evolução da indústria de cruzeiros, com a vinda de navios maiores e mais modernos à costa brasileira.

Fonte: Valor

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