COMO A VOLATILIDADE DO PREÇO DO PETRÓLEO PODE IMPACTAR NOS INVESTIMENTOS NO SETOR DE O&G — ÓLEO E GÁS?


A situação atual do planeta aponta para um futuro de desafios e incertezas em mercados produtivos e de serviços de todo o tipo. Como um setor que serve de base energética para todos eles, a indústria de Óleo e Gás (O&G – Oil and Gas) deve passar por mais um momento duro de volatilidade do preço do petróleo.

O que a história nos conta é que é possível se preparar para esses cenários e planejar um resultado positivo diante de crises. Portanto, para que você possa entender melhor essa relação, convidamos a Professora e Pesquisadora da FGV Energia, Fernanda Delgado, para uma conversa sobre causas, consequências e o como o setor se empenha para sair desse momento tão crítico. Acompanhe.

Quais fatores impactam no preço do petróleo?

Toda commodity tem seu preço regulado pela lei da oferta e procura. Os leilões de petróleo são uma perfeita definição dessa verdade. Porém, como Fernanda começa nos explicando, existe uma particularidade no setor dada, principalmente, pela sua importância.

Não apenas mercados, mas governos também influenciam nesse valor. Forças geopolíticas podem impactar em acordos de importação e exportação, coalizões, quebras de relacionamento e até guerras — como já aconteceu no passado.

Portanto, quem lida com o setor precisa de uma visão muito mais abrangente do que apenas a demanda atual pelo insumo. A professora dá um exemplo do poder de relações internacionais nesse cenário:

“Na reunião entre OPEP — Organização dos Países Exportadores de Petróleo — e a Rússia, em 6 de março, o que se esperava era um consenso para um corte de produção que levasse os preços para cima. Mas um descolamento de intenções levou a uma direção diametralmente oposta, na qual a Arábia Saudita decidiu inundar o mercado com uma quantidade ainda maior de petróleo produzido. Os preços chegaram a algo em torno de 20 dólares o barril, menor valor em 18 anos.”

Quais foram as principais oscilações dos últimos anos?

Está claro que estamos vivendo neste atual momento uma dessas grandes oscilações para produtores e toda a cadeia de Oil & Gas. E, para passar por ela, é importante entender causas e efeitos de momentos similares ou análogos mais recentes. Para isso, pedimos que a professora da FGV Energia citasse os mais importantes nos últimos anos.

2008

A chamada crise dos subprime nos Estados Unidos afetou todo o mercado, inclusive, de petróleo. Esse, porém, é um momento de recuperação considerada rápida.

“Um superciclo no valor das commodities fez com que o petróleo valorizasse a mais de US$100 o barril, incluindo aí a explosão da demanda nos países emergentes,” conta a especialista.

2011

O que desencadeou a oscilação de 2011 foi a chamada Primavera Árabe, uma série de revoltas e guerras civis que interrompeu o fluxo de produção na Líbia. Nesse caso, também houve aumento significativo de preços pela redução da oferta.

2014

Mais recente, a queda drástica de preços entre 2014 e 2015 foi motivada pela revolução do shale gas (gás de xisto) nos EUA. Houve uma explosão de oferta no mercado e expectativa sobre a capacidade do país de concretizar esse potencial com investimento em infraestrutura — tornando-se exportador de petróleo, algo impensado até recentemente.

2020

O ano de 2020 começa com uma oscilação histórica e um cenário inédito para o mercado de O&G. Como já citamos, o preço do barril chegou a preços muito baixos devido a uma queda em demanda que nenhuma empresa ou país poderia se preparar.

As medidas de restrição social e de trânsito de pessoas para mitigar a contaminação da Covid-19 reduziram em muito o uso da matriz energética. É um momento de incerteza e de preparo para superar desafios.

É o que aponta a professora. Segundo ela, ainda não dá para concluir se há uma nova estrutura em vigor com preços estruturalmente deprimidos. “A esperança é que haja uma perspectiva mais clara a partir da reunião da OPEP de 5 de junho.”

Como essa volatilidade no preço do petróleo impacta nos investimentos do setor?

O momento que estamos vivendo é perfeito para estudo de ações de contenção e superação que empresas estão empregando para se adaptarem ao mercado — pelo menos a curto prazo.

Pedimos à Fernanda que nos desse um panorama sobre como as grandes instituições no mercado estão lidando com um desafio tão repentino:

  • Chevron: pretende reduzir gastos e diminuir produção, com redução de investimentos em 20%;
  • Equinor: corte de investimentos, de perfurações exploratórias e de custos operacionais em US$ 3 bilhões, além da suspensão do programa de recompra de ações de US$ 5 bilhões;
  • Exxon: redução de US$ 30 bilhões em investimentos no ano de 2020;
  • Saudi Aramco: redução de investimentos de US$ 32,8 bilhões em 2019 para US$ 25 bilhões em 2020;
  • Shell: redução de investimentos em US$ 5 bilhões de dólares e suspensão do plano de recompra de ações de US$ 25 bilhões;
  • Petrobras: redução de investimentos, corte de gastos operacionais e adiamento do pagamento de dividendos.

Além dessas medidas, a empresa brasileira ainda reduziu a produção em 200 mil b/d, salários e a jornada de trabalho dos funcionários. É um sinal de que o momento é para contenção de despesas e readequação de expectativas para sofrer o menor impacto possível antes de planejar os próximos passos.

Como esses investimentos, ou falta de investimentos, impactam no desenvolvimento do setor?

Não tem como fugir disso: analisando os números, o cenário atual é de grandes dificuldades para o setor de petróleo. Com certeza, isso vai atrasar o desenvolvimento do setor. Um exemplo apontado por Fernanda é o plano de desinvestimentos em refinarias da Petrobras, que pode ser estendido por um prazo maior.

Menos demanda e preço baixo significa menos capacidade de investimento em pesquisa. A própria Petrobras trabalha com um equilíbrio ideal de valor entre 35 e 45 dólares por barril, bem longe do que está sendo praticado no momento.

É durante as crises também que surgem novas oportunidades. O investimento em energia sustentável e eficiência produtiva nos últimos anos já começa a fazer efeito e pode apontar novos caminhos para o setor em um futuro próximo.

Da mesma forma que o mercado se recuperou da volatilidade do preço do petróleo anteriormente, haverá caminhos e cursos que ficarão mais claros assim que passar o momento mais crítico atual.

E se há uma lição para os próximos anos e próximas oscilações, é que investimento em tecnologia significa inteligência para se recuperar de baques mais rapidamente. Esse foco em disrupção e processos eficientes na cadeia do petróleo será necessário assim que houver uma recuperação do mercado.

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